O meu
sentido da Europa e de Portugal é distinto do comum. A minha Europa não é a comunidade
económica nem a união política. Das teses correntes sobre Portugal digo o
mesmo.
A minha ligação
à Europa vem dos poemas de Homero e da tragédia antiga, funda-se no pessimismo
heróico nascido nas margens do Egeu e nas lendas dos ciclos indo-europeus,
prossegue no espírito das Cruzadas e nos romances da Bretanha, e vive também nas
histórias de amor e guerra, grandeza e morte, que foram contadas por
Shakespeare, Calderón de la Barca e Corneille.
Do mesmo
modo, a minha ligação a Portugal, uma ligação física, carnal, palpável, tem a ver com a espada do Rei-Fundador, a abóbada
da Batalha, o horizonte de Sagres, as páginas de Vieira,
Bernardes e Camilo, a voz da Amália — e o Eusébio.
Eis os signos. Pode parecer estranho, mas as actuais problemáticas, como dizem os parvinhos, têm o condão de me reduzir à mais completa indiferença. Saber se a tróica fica ou vai embora, discutir o modelo social europeu e a dimensão do Estado, polemizar entre esquerda e direita, serão actividades seríssimas e estimulantes — mas só as pratico por dever social, como quem fala do tempo com a vizinha de baixo. Sou europeu da cabeça aos sapatos e português de uma só peça. Mas, nascido assim com feitio enviesado e de certa telha anarquista, nunca admiti por símbolos nacionais o hino horroroso — e ainda
menos o trapo verde e tinto, bandeira a martelo de um país de bêbados.
Foram sempre outros os meus símbolos. Ora, a julgar pelas
declarações de ontem e hoje, pouca gente entendeu a dimensão de Eusébio. Para uns,
parece que foi um futebolista extraordinário — e entretêm-se em comparações
disparatadas. Certo tolinho, movido de inveja, capitula-o de homem bom, mas inculto. Tem razão. Faltou-lhe certamente ciência para criar a
Fundação Eusébio — e ficar a viver por conta do Estado, sentado de babete à mesa do Orçamento. Houve
outros, mais chegados à verdade, que o classificaram de imortal. Mas imortal já
ele era havia muito, estatuificado em vida, o que é raro entre nós. Eusébio corporizou um daqueles mitos que as nações históricas geram para assegurar a sua existência. Foi a última
grande figura portuguesa. Depois dele, quem?
MUITO BEM. É ISTO MESMO! Tudo o resto é parlapatice sem qualquer valor e destinada aos papalvos que estão de pescoço esticado fixados na TV pendurada na parede do café. Obrigado.
ResponderEliminarPalavras nobres e justas, as suas, que tão magnìficamente descrevem o que é ser-se um português de corpo inteiro. Soubera tão bem escrever e assim me expressara.
ResponderEliminarTanto quanto os demais citados, o ser humano que foi Eusébio é merecedor de todas elas. Pelo seu inquestionável exemplo de português bem formado e de patriota acima de tudo, sem comparação possível com o monte de esterco que nos rouba e desgoverna há quarenta anos, este homem simboliza na sua integridade e grandeza sem alarde, o que de melhor existe na alma portuguesa.
EUSÉBIO FAZ PARTE DAQUELE CÓSMICO SONHO QUE UM DIA OUTRO GRANDE HOMEM, OUTRO GRANDE PORTUGUÊS TEVE NOS VERDEJANTES CAMPOS DE OURIQUE - D. AFONSO HENRIQUES!
ResponderEliminar