Se o soubessem ler, Tomás de Figueiredo seria um escritor para o nosso tempo. A
sua obra é flagrante de actualidade. Os sujeitos que fazem hoje as capas dos
jornais estão lá todos, os banqueiros, os oportunistas, os burgueses hipócritas
com suas "esposas sem par" a abichar cargos e dinheiro, administradores de não
sei quantas empresas públicas, sempre disponíveis para mais um arranjinho.
No magnífico A Gata Borralheira, de 1961, avulta o Dr. Silvério Carvalhal, dilatado na sua mediocridade, com a estúpida da filha em redor: "Agora que o pai já estava em quatro companhias e bancos, director de todos, e que, assim, passava a ter mais tempo livre, menos obrigações e ralações, menos processos a ver à noite, iam finalmente comprar um automóvel (...)"
No magnífico A Gata Borralheira, de 1961, avulta o Dr. Silvério Carvalhal, dilatado na sua mediocridade, com a estúpida da filha em redor: "Agora que o pai já estava em quatro companhias e bancos, director de todos, e que, assim, passava a ter mais tempo livre, menos obrigações e ralações, menos processos a ver à noite, iam finalmente comprar um automóvel (...)"
Se o soubessem ler,
disse. Tomás apresenta um vocabulário opulento e castiço, uma prosa a vários
títulos inovadora. É um grande mestre da língua, que renovou como poucos, um
estilista primoroso, bem diferente da fancaria que por aí se vende agora e recebe
prémios. Ele próprio, corrosivo, indicava a regra a seguir pelo romancista
português, se pretende imprimir uns milheiros de exemplares e apurar uns cobres:
"fuja da Língua Portuguesa, e fuja a toque de caixa". Melhor ainda será que
saiba o menos possível do idioma. Não deve pretender que até ele suba o leitor;
deve, sim, descer humildemente até às letras gordas do público.
Num tempo de escritores de reduzido vocabulário, resvés do básico, que se amanham com umas dúzias de expressões preguiçosas e já puídas, Tomás brilha e brilha. Ele sabia que escrever é mais do que contar uma história. É fazer do velho novo, esmerilhar a palavra certa, pesá-la sílaba a sílaba, compor vivo e nas quatro dimensões. Exige oficina e custa dezenas de anos.
Possível que um dia se estude a obra de Tomás como ela merece. Por enquanto, ainda é a hora dos promissores talentos analfabetos, dos que tropeçam nas preposições e concordâncias — e dos que, num arremedo de consciência, grafam o nome em minúsculas para que fique proporcionado à dimensão literária da obra.
Num tempo de escritores de reduzido vocabulário, resvés do básico, que se amanham com umas dúzias de expressões preguiçosas e já puídas, Tomás brilha e brilha. Ele sabia que escrever é mais do que contar uma história. É fazer do velho novo, esmerilhar a palavra certa, pesá-la sílaba a sílaba, compor vivo e nas quatro dimensões. Exige oficina e custa dezenas de anos.
Possível que um dia se estude a obra de Tomás como ela merece. Por enquanto, ainda é a hora dos promissores talentos analfabetos, dos que tropeçam nas preposições e concordâncias — e dos que, num arremedo de consciência, grafam o nome em minúsculas para que fique proporcionado à dimensão literária da obra.
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