MARX, FREUD E ERICA FONTES

Dois profetas dos tempos modernos, Marx e Freud, deixaram rasto não apenas no campo económico e clínico, mas também na área da literatura. Marxismo e freudismo apoderaram-se de tal modo da ficção que, por anos e anos, custou descobrir um romance em que as personagens não fossem vítimas da exploração económica ou da opressão da libido. Em certos volumes, acumulavam. O prosador sabia que, para obter a aprovação geral, preciso era apresentar a protagonista sob as garras do patrão explorador ou debaixo de um marmanjo lascivo.
Como o tema neo-realista passou um tanto de moda, perdurou o sexo. O problema é que não é fácil escrever sobre sexo. Por via de regra, a
s descrições são foleiras. Os brasileiros superam-nos de largo. Não encontro na literatura lusa a obscenidade estilística de um João Ubaldo Ribeiro ou a sensualidade matizada de um Rubem Fonseca. Por cá, abunda um registo de exageros e lugares-comuns. Os homens têm sempre "erecções gigantescas", "erecções colossais", por vezes ao primeiro olhar, e as mulheres, todos os dias "insinuantes" e "insaciáveis",  atingem "orgasmos sucessivos" e "violentos".
Por isso mergulhei com esperança na autobiografia de Erica Fontes, a nossa pornstar emigrada em Los Angeles. Não esperava dela, ou de quem escreveu o livro, um estilo elegante e primoroso, mas pelo menos algum realismo fisiológico e de costumes. Uma desilusão. Descobri logo, ao fim das primeiras páginas, que a miúda está é apaixonada pelo namorado. Há por ali passos melosos e quase poéticos da sua relação com o rapaz. Ora, para essas melopeias da paixão já 
tínhamos a Maria Teresa Horta. De uma actriz pornográfica, galardoada com um prémio XBIZ, que é uma espécie de óscar do género, esperava mais. A sério que esperava.

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